Reforços
Numa daquelas coisas dos media, ficaram hoje juntas, algures na ordem do dia, duas notícias sobre crianças e sua educação.
A primeira tratava do caso de uma criança obesa no Reino Unido, em que os serviços sociais estavam a avaliar a possibilidade de retirar a custódia aos pais, acusando-os de negligência (entretanto já foi decidido que "por agora" a criança não será retirada).
Apesar de pouco mais ter visto que a pouco rigorosa reportagem da SIC (que no inicio diz que a criança pesa 90 quilos, "três vezes mais que o normal para a idade" e mais para o final informa que já chegou a pesar 98 quilos, "quatro vezes mais que o normal"), preocuparam-me as declarações da mãe:
"Ele recusa comer fruta, vegetais, saladas. Só quer comer alimentos processados. Quando não come mais nada, tenho de lhe dar as comidas de que ele gosta, não posso deixá-lo à fome."Saltou-me à vista a dificuldade que esta mãe tem em lidar com a vontade do filho. Não desprezando que deverá existir algo de patológico no apetite da criança, a justificação com "ele recusa comer fruta" não me parece minimamente aceitável.
Estou certamente formatado pelo estilo de educação que tive, mas tenho recentemente partilhado o quanto agradeço uma frase, injusta e que muito me irritava, que ouvi muito em criança: "Tu ainda não tens idade para ter querer".
Nunca fui espancado, nem me lembro de levar muita palmada... Lembro-me mais talvez de ficar de castigo no quarto.
Mas lembro-me de ser bem educado, com disciplina e cultivo da responsabilidade, com independência mas com noção da realidade e do meu lugar.
E por isso neste caso não pude deixar de pensar que a mãe devia era colocar-lhe sempre o mesmo prato na mesa até o comer.
Mas falta a segunda notícia... A condenação, por parte do Conselho da Europa, da decisão do Supremo Tribunal de Justiça, de Abril de 2006, em que os castigos corporais são considerados lícitos desde que moderados e com fim educacional.
Eu não acho que a palmada seja solução na educação de uma criança. Nem quero educar os meus filhos assim. Mas acredito que a educação se faz através de reforços positivos e negativos.
Deve-se apostar essencialmente nos positivos, indiscutivelmente (e os negativos devem existir mas não sobre forma de violência física ou psicológica). Mas o que me parece é que nos dias de hoje não se aplicam nem uns nem outros. Não se castigam os comportamentos errados, tal como não se premeiam os correctos. Os educadores, por falta de tempo, má preparação ou mesmo deformação sociológica, descartam-se do seu papel e deixam os jovens sob sua alçada entregues à sua própria vontade, egoísmos e apetites.
Irónico é que com isto as crianças desenvolveram elas próprias o seu sentido inato de reforço positivo/negativo e aplicam-no nos pais para obterem o que querem. E assim há uma inversão de valores que leva à domesticação dos pais por parte dos filhos.