Relatividade...
Pela primeira vez, assistir a estas imagens não me trouxe de imediato sentimentos de repúdio pelos maltratos aos animais, de estupefacção pela manutenção de tradições estúpidas, e de júbilo pelas pisadas e cornadas que alguns participantes têm a sorte de levar.
Desta vez o que me surgiu na cabeça foi: «Alguma vez vou poder voltar a correr assim?».
Lembrei-me dos 10 segundos que demorava a correr metade da rua lá em Lisboa, só para no fim ouvir alguém dizer «Parecias um foguete!»; lembrei-me das provas de velocidade que ganhava na Escola; lembrei-me das minhas fugas aos rufias que me perseguiam na Escola; lembrei-me das apostas «Eu vou por aqui e tu por ali, mas não vale correr...»; lembrei-me das escadas mais íngremes do Cacém; lembrei-me das ruas estreitas das vilas da Madeira; lembrei-me dos 25 minutos que demorei desde aqui de casa ao Colombo; lembrei-me das minhas mudanças de direcção, em ângulos de quase 90º, sem perder velocidade; lembrei-me dos ataques de fúria, que me faziam correr feito louco; lembrei-me dos ataques de euforia, que me faziam correr feito louco; lembrei-me da sensação de voo e liberdade, que tinha ao correr pelas ruas de Lisboa...
E depois lembrei-me... dos touros.
Por mais fiel que se seja a uma causa, por mais empenhado que se esteja num problema, tudo é relativo. Não podemos nos preocupar com tudo, não temos capacidades para tal. Há que eliminar problemas.
Talvez fosse de esperar que o critério fosse o dos problemas maiores e mais importantes primeiro. Mas não o é. Aplica-se uma mistura entre o "princípio da subsidiariedade" e o egoísmo.
As pessoas tendem a se preocupar com os problemas que as afligem mais directamente. Não é uma atitude condenável, é perfeitamente humana, animal, natural.
Não há que esperar, portanto, que as pessoas se preocupem com reciclagem, quando têm um emprego precário; que se preocupem que a Fátima Felgueiras ande a roubar a câmara, quando na noite anterior foram eles roubados na sua própria rua; que se preocupem em ir votar, quando o Domingo é dos poucos dias que têm para saírem com a família.
Este não vai ser um país evoluído e civilizado enquanto as pessoas tiverem de se preocupar com a sobrevivência dos seus, e com a manutenção do seu bem-estar no dia-a-dia. Quando os cidadãos puderem tomar estas coisas como garantidas, então sim disponibilizarão tempo para pensar e serem culturalmente, socialmente, politicamente e ecologicamente activos.
Mas convirá isso à classe politica, tão bem instalada no seu sistema de poder rotativo? O que será mais fácil: governar, ou criar novos problemas, que ocupem mais um bocado o cidadão, para que não pense?
Eu estou a sentir a crise na pele... Porém, à minha volta não vejo ninguém em situação semelhante... E os voos para qualquer destino de férias encontram-se cheios... Existirá mesmo esta crise económica, que todos preocupa e que tanto pessimismo levanta?
Os ataques de 11 de Setembro foram marcantes, pela sua originalidade e destruição... Mas o número de atentados terroristas subiu em relação aos anos anteriores? Estaremos mesmo sobre essa grande ameaça, de ataques iminentes e de permanente código amarelo, e que justifica intervenções militares, politicas e económicas em outros países?
São apenas alguns exemplos... Mas já pararam para pensar, afinal, quais são ou não são os verdadeiros problemas?
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