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sábado, 11 de outubro de 2003

Estou confuso...

  Acabado de ler mais um post sobre o aborto, lembrei-me de postar um texto que escrevi em Março de 1998, antes do Referendo à Interrupção Voluntária da Gravidês.

  Abro-o, leio-o. Não concordo com 80% das coisas que escrevi na altura. Muita coisa mudou na minha vida, entretanto. Coisas que até posso não valorizar. Coisas que até posso nem notar. Mas que em certos momentos vêm ao de cima.
  Mantenho-me apoiante do "Sim", porém. Por dois motivos, um humano e outro cientifico.

  O primeiro tem a ver com o respeito pelo livre arbítrio de qualquer pessoa, pela escolha da mulher ou do casal. A sociedade estabelece regras. Essas regras visam manter a coesão e funcionamento dessa sociedade, e baseiam-se no sistema de valores da maioria. Se alguém não se adapta à sociedade, ou sai dela (quase impossível nos dias de hoje, tudo está socializado) ou se sujeita às medidas de reeducação estabelecidas pela sociedade.
  O limite é a liberdade individual de cada um. Se uma acção não tem efeito sobre qualquer outro elemento da sociedade, esta não tem o direito de intervir e estabelecer regras.
  Porém, para que tal seja o caso no aborto, é preciso que o segundo motivo seja também verdade, ou seja, que apenas esteja envolvido um elemento da sociedade.

  E esse segundo motivo é eu acreditar que a vida humana não se inicia com a fecundação, mas sim com o início do funcionamento do sistema nervoso central. É, aliás, o único parágrafo que aproveito do texto de 1998.

[Aborto – Uma imposição de consciência (04/03/1998) - editado]
Outro argumento bastante utilizado, senão o mais utilizado, é o da alegada vida humana do feto, e que ao abortar estamos a cometer um homicídio. Pois bem, eu confirmo que o feto tem vida. Tal como tem o cabelo que cortamos, as unhas que roemos, o esperma que ejaculamos ou os óvulos que mensalmente produzimos e não são fecundados. Mas então qual é a diferença entre estes “seres” vivos e os humanos? A razão, o pensamento, os sentimentos, tudo aquilo que caracteriza os seres humanos. Isso não surge no feto senão umas semanas após a fecundação. Aliás, esta situação parece-me um tanto ou quanto ridícula, visto que a maioria dos óvulos fecundados não sobrevivem, abortando naturalmente, a maior parte das vezes sem a própria mulher dar por isso. Ora, segundo esta ideia da vida a partir da fecundação, temos que fazer alguma coisa. Parem tudo, não investiguem a cura para a Sida, não tratem os cancros, alguém tem de salvar estes milhares de vidas que morrem diariamente.

  Assim, não há outra pessoa envolvida. Trata-se de uma decisão da mulher, que apenas a ela afecta, e não a posso obrigar a nada. É o seu corpo, é a sua vida.

  Quando me mostrarem razões objectivas para acreditar que a vida se inicia aquando da fecundação, mudo a minha posição. E razões objectivas não implicam científicas, apesar de o estudo científico ser a tentativa do homem de compreender a criação de Deus. Não há motivo para guerra entre ciência e religião, mas, se preferirem, apresentem-me razões religiosas objectivas.

  PS: Ponderei se deveria ou não postar o texto de 1998. Acabei por optar não o fazer.

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